Athos Matheus da Silva Guimarães

A NARRATIVA SOBRE A ADESÃO DO PARÁ À INDEPENDÊNCIA NO LIVRO DIDÁTICO DA ESCOLA PROF. ANTÔNIO GONDIM LINS: PRIMEIROS RESULTADOS

O presente trabalho tem como objetivo demonstrar os resultados do projeto de pesquisa “Adesão do Pará à Independência: memória e ensino de história”, coordenado pelo professor doutor Adilson Junior Ishihara Brito, financiado pelo CNPQ e realizado no Campus de Ananindeua. Esse texto tem como objetivo expor os resultados conquistados até o momento a partir das análises realizadas no livro didático utilizado pela escola prof. Antônio Gondim Lins, neste caso buscamos identificar a construção de narrativas sobre o fato histórico da Adesão do Pará à Independência e como está construída neste manual, neste caso, analisamos livro do segundo ano do ensino médio pois foi nesse livro que conseguimos identificar uma narrativa específica em relação ao fato histórico. Além desta questão, o nosso objetivo é compreender a influência desta narrativa na construção de uma memória sobre a Adesão e a construção de identidade com este fato.

O livro analisado é do segundo ano do ensino médio, é de autoria do professor doutor Divalte Garcia Figueira com o título “ História: 2° ensino médio, da coleção integralis. A construção da narrativa sobre a Adesão é significativa para compreendermos diversos processos sobre os objetivos da construção da memória pelo fato de a metodologia utilizada para expor o respectivo fato poderá influenciar na identificação ou distanciamento desta memória, ou até mesmo o desconhecimento sobre a mesma.

Data magna do Estado do Pará
Para compreendermos um pouco melhor esse debate iremos fazer uma contextualização sobre a importância do debate. A adesão do Pará se tornou data magna a partir de um projeto proposto pelo então deputado estadual Zeno Veloso, neste caso, essa data tinha como objetivo a construção de uma identidade em torno do fato histórico. A partir deste feriado seriam criadas atividades tanto nas escolas quanto fora delas para construir uma identificação em torno da Adesão do Pará. A proposta da data magna é baseada na Lei Federal nº 9.093, de setembro de 1995, no caso tinha como objetivo obrigar os Estados a comemorarem em um dia sua data magna.

A data magna teria um cunho pedagógico, com o intuito da sociedade paraense identifica-se com esse processo histórico, possui se uma memória ligada ao fato histórico. A data magna torna-se uma referência para a população construir suas memórias. O texto da  Circe Bittencourt, “As ‘tradições nacionais’ e o ritual das festas cívicas”, nos faz refletir sobre a utilização de outras ferramentas para a consolidação de uma respectiva memória, principalmente pelo a aparato governamental que tende a utilizar inúmeras ferramentas para consolidar memórias que seguem sua própria ideologia.

Segundo Circe “O poder governamental, ao veicular pelos diversos programas de ensino para a escola a memória histórica desejável, tem examinado a necessidade de valer de outros instrumentos educacionais para sustentar e fazer perpetuar, na memória dos alunos, quem deve ser considerado agente histórico responsável pelos ‘destinos do País’” (BITTENCOURT, P. 53).

A data magna torna-se uma ferramenta para a consolidação de uma memória em determinada região, a seleção de um determinado processo histórico para se tornar um feriado é a partir de construções que tem como objetivo o cunho pedagógico  para “conscientizar” uma sociedade a se espelhar naquela respectiva data.

Diante dessa problemática podemos refletir sobre as construções de memórias a partir destas ferramentas, a partir da data magna do Pará e objetivo que ela carrega no intuito de influenciar as escolas realizarem ligações dos discentes com a memória que desejam consolidar. Almejando a construção de uma memória, encontra na escola o principal palco para a perpetuação de uma memória, principalmente utilizando-se de uma das principais ferramentas do ensino, que no caso é o livro didático.

Algumas percepções sobre os livros didáticos
O espaço escolar é um palco de disputas constantes pela consolidação de discursos e ideologias que permeiam a sociedade, e dentre essas disputas está o livro didático como ferramenta para auxiliar essa construção de memórias. O livro didático tornou-se mais do que simplesmente um auxílio ao professor na sala de aula, é também um produto de alto lucro para as editoras e grande perpetuador de discursos ideológicos. Nesta questão, o ensino de história entra nessa problemática, pois é uma das disciplinas que está em constante debate ligado a memória, dependendo da metodologia utilizada tanto pode consolidar um discurso quanto pode distanciar o discente daquele período. Assim, o livro didático possui, no território brasileiro, um papel fundamental de consolidação de memória, o objeto mais utilizado nas salas de aula o livro didático assume a responsabilidade de ditar formas e metodologias que deverão ser construídas nas aulas. Desta maneira, estes respectivos objetos de ensino movimentam setores sociais, políticos e econômicos em torno da ambição de moldá-lo, construí-lo e negociá-lo. O âmbito educacional se permeia de intenções nos livros que são selecionados por diversos setores além do professor, com o livro leva-se cargas de interesses ideológicos para o espaço escolar.

Inegavelmente o livro didático é mais utilizado e comercializado no ensino público atualmente, movendo gigantescas somas financeiras e o interesse de se estar dentro destas negociações. Aproveitando-se da situação educacional brasileira, as editoras prestam-se a elaborar livros didáticos que proporcionem facilidades para construir as aulas, assim o livro didático passa a se tornar o principal meio de informação e formação tanto do docente quanto do discente.

Em um texto da professora Célia Cassiano possibilita a reflexão sobre esses objetivos dos livros didáticos, “Provavelmente foi escrito, editado e vendido e comprado em função da escola, sendo esse tipo de recurso didático vai ter sua importância ampliada em países como o Brasil, nos quais as condições precárias da educação fazem com que ele acabe determinando conteúdos e decidindo estratégias de ensino “ (CASSIANO, P. 34 ). Neste caso, as editoras produzem seus materiais a partir das carências que existem em cada região, no objetivo de conseguir vender e lucrar com estes materiais.

Ao analisar o livro didático da escola prof. Antônio Gondim Lins percebe-se uma preocupação em expor o conteúdo em volta do exame nacional do ensino médio (ENEM), o objetivo do livro possui o intuito de seu conteúdo esteja voltado para o principal, atualmente, prova de ingresso ao ensino superior. Atende a uma construção de um objetivo que é ingressar em um ensino superior, o mercado vai atender essa necessidade, vai buscar se adaptar a esse movimento que solidifica.

Podemos compreender sobre isso a partir do texto da professora Kazumi Munakata. Segundo a autora “Mercadoria, o livro precisa adaptar-se à demanda. Se a ventura sopra a favor das reivindicações democráticas, progressistas e até mesmo esquerdistas; […] A empresa capitalista que produz livros a esse respeito prefere atender a essa demanda  do que permanecer fiel  à sua resposta ‘ideológica’. Ou melhor, o mercado é a própria ideologia dessas empresas” (MUNAKATA, P. 274). O mercado editorial estará sempre em busca de se adaptar a realidade que está presente no sistema educacional, em busca de lucros, as editoras tendem a seguir o que almeja na sociedade ou ideologia que se perpetua.

No caso do livro didático analisado, tende a seguir a um desejo da maioria da sociedade. Contudo, alguns debates acabam sendo reduzidos ou quase não aparecendo pelo fato de não estarem alinhados ao Enem, como por exemplo, a história regional, e neste caso a narrativa sobre a Adesão do Pará à independência encontra-se, neste livro, resumido a poucas linhas do manual. Desta forma, a narrativa sobre adesão do Pará é construído de forma reduzida demonstrando não está alinhado aos objetivos mais amplos, no caso, é Enem.

A construção da memória sobre a adesão na narrativa do livro didático
O ensino de história possui diversas perspectivas sobre sua construção e os métodos que permeiam este campo, somando-se ao fato de que existe pressões cada vez mais intensa sobre as formas de como será abordado o conteúdo provoca o Ensino a se modificar. Os conflitos existentes no âmbito educacional são pautados, também, sob a ótica da consolidação ou desconstrução de uma determinada sociedade, que dentro de diversos movimentos por reconhecimento de uma memória, no qual impulsiona cada vez mais os conflitos.

A construção da narrativa sobre a adesão do Pará no livro didático da escola prof. Antonio Gondim Lins possui uma ligação mais forte com a imagem de D. Pedro I e a maneira que foi resolvido o impasse naquela região do que demonstrar os aspectos regionais do Grão- Pará no momento de conflito e de Adesão à independência. O pequeno trecho de poucas linhas nos possibilita compreender algumas nuances da construção dessa narrativa, tanto de uma história de âmbito nacional, no caso demonstrando a imagem de D. Pedro I, e uma narrativa ligada a aspectos de agentes externos, como no caso a imagem da Inglaterra como mediadora de conflitos e financiadora dos projetos existentes. Pouco se encontra sobre a adesão, apenas identifica a existência de conflito naquela região pelo fato de tropas terem sido enviados, porém não se aprofunda no debate, simplesmente menciona a rapidez da solução do conflito. A narrativa sobre a adesão está mais a serviço de uma exaltação nacional do que demonstrar o fato histórico em sua profundidade, no caso torna-se uma incoerência diante de uma data magna ser sobre Adesão do Pará à independência que possui o objetivo de servir como referência para a consolidação de uma memória, porém, encontra-se no livro didático um esvaziamento da mesma.

O ensino de história dentro do âmbito escolar lida com diversas problemáticas que a escola proporciona. O debate  em torno do ensino de história permeia-se com a busca, cada vez mais intensa, de reconhecimento e de conquista de espaço, da oportunidade de expor debate sobre a memória presente  cotidianamente, principalmente elitista, e aquela que almeja conquistar seu espaço na escola, principalmente as que são constantemente marginalizadas. Segundo Fabiana Almeida e Sonia Regina Miranda “São frequentes os movimentos de determinados grupos sociais mobilizando discursos de memória, antes esquecidos ou silenciados no tempo, a fim de reivindicar seu lugar no mundo como sujeito na História” (ALMEIDA E MIRANDA, P. 262). A escola e o ensino história possuem o desafio de problematizar e de expor outros vertentes existentes, “A escola, e especialmente o ensino de história como campo de saber onde tais questões normalmente são atribuídas como de sua responsabilidade, é profundamente afetada pelos efeitos desse debate” (ALMEIDA E MIRANDA, P. 264).

A busca de espaço no âmbito escolar é responsável por diversos debates, a memória introduzida e problematiza terá como consequência o reflexo de identidade sob a ótica do discente, onde diversos espelhos estão fragmentados em busca da remontagem.

Segundo Fabiana Almeida e Sonia Miranda “[…] O ensino de história constitui-se como campo aberto a todo tipo de reflexão acerca da reconstrução de identidade dos alunos, bem como de todas outras possíveis histórias” (ALMEIDA E MIRANDA, P. 268). O ensino de história agrega essa responsabilidade de debater sobre as construções de identidades. Nesse mesmo rumo, a escola possui o papel de agregador e, ao mesmo tempo, de marginalizar ao escolher qual memória possui o mérito de transitar no âmbito educacional.

Conclusão
Portanto, a adesão do Pará à independência possui perspectivas conflitantes no objetivo de construir uma memória sobre o fato histórico. Existe uma data magna referente a mesma que tem como objetivo ser uma referência para a sociedade com o intuito de construir uma memória em torno deste fato, a partir de eventos tanto no âmbito escolar quanto fora dele em referência a data magna, uma ferramenta pedagógica que o governo utilizou para consolidar a memória que deseja. Em contrapartida, não se tem a mesma intensidade no livro didático analisado, no qual o fato histórico fica resumido em pequeno espaço deste manual, dando mais ênfase aos agentes externos do que aspectos regionais em relação ao processo da adesão. A pesquisa continua na busca de compreender a construção desta memória no espaço escolar prof. Antonio Gondim Lins.


Referências 
Athos Matheus da Silva Guimarães é graduando do curso de história do Campus da UFPA em Ananindeua. Bolsista pibic do projeto de pesquisa “Adesão do Pará à Independência: memória e ensino de história”, coordenado pelo professor doutor Adilson Junior Ishihara Brito, financiado pelo CNPQ e realizado no Campus da UFPA em Ananindeua.

ALMEIDA, Fabiana Rodrigues; MIRANDA, Sonia Regina. Memória e História em livros didáticos de História: o PNLD em perspectiva. Educar em Revista, v. 28, n. 46, p. 259-283, 2012.

BITTENCOURT, Circe. As “tradições nacionais” e o ritual das festas cívicas. IN: PINSKY, Jaime (org.). O ensino de História e a criação do fato, 14 ed. São Paulo: Contexto, 2014. p. 53-92.

DE FIGUEIREDO CASSIANO, Célia Cristina. Aspectos políticos e econômicos da circulação do livro didático de História e suas implicações curriculares. História (São Paulo), v. 23, n. 1-2, 2004.

FLEXA,Marcio. “A Adesão do Pará à Independência é data magna do calendário cívico paraense”. IN: Agência Pará. Acessado 06/03/2018. Link para acesso: http://www.agenciapara.com.br/Noticia/104076/a-adesao-do-para-a-independencia-e-data-magna-do-calendario-civico-paraense.

MUNAKATA, Kazumi. Histórias que os livros didáticos contam, depois que acabou a ditadura no Brasil. IN: DE FREITAS, Marcos Cezar (Org.) Historiografia brasileira em perspectiva, 6° ed. São Paulo: Contexto, 2007. p. 271-296.

2 comentários:

  1. Bom dia, prezado Comunicador Athos da Silva,

    Em sua comunicação, percebe-se a preocupação em analisar as narrativas históricas difundidas em livros didáticos, especificamente no tema sobre a Adesão do Pará. Em sua conclusão, o senhor evidencia que existe um privilégio da história nacional sobre a história local. Pergunto-lhe, como o senhor chegou a essa conclusão? O autor do livro didático citado coloca no sumário ou omite a sua predileção pela História nacional?

    Cordialmente,

    Danilo Sorato Oliveira Moreira.

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    1. Olá, Danilo Sorato,

      Obrigado pelas suas observações e também suas perguntas.Cheguei na conclusão de que existe uma prefêrencia da História nacional sobre a história local na maneira que o texto está presente no livro didático, a Adesão do Pará não possui um destaque e nem um aprofundamento sobre esse processo histórico, a preocupação do texto, nesta parte, é a de demonstrar a maneira que o governo imperial utlizou para a permanência desta região ao restante do Brasil, de manter a integralização nacional.

      Segundo ponto que poderia destacar e que reforça minha conclusão é o fato de o livro ter sua construção voltada para o Exame nacional do Ensino Médio (ENEM), o enem tem um foco mais interessado em expor a história nacional em suas provas. O livro didático no qual análisei possui em sua aprentação o objetivo claro de seus conteúdos serem voltados para o enem, neste sentido os debates presentes neste manual será voltado para este processo seletivo.

      Na apresentação deste livro, o autor e a editora expõe o fato de mostrarem alguns assuntos da história do Brasil e da "história geral", apenas deixam claro qual seu objetivo que é de ligar o seu conteúdo ao enem. No sumário ele deixa claro que abordará assuntos sobre a história nacional, com pespectivas que dão o foco apenas na história nacional.

      cordialmente,

      Athos Matheus da Silva Guimarães.

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