Rafael Fiedoruk Quinzani e Ane Carine Meurer

AS CONTRIBUIÇÕES DO PIBID INTERDISCIPLINAR- EDUCAÇÃO DO CAMPO NA FORMAÇÃO INICIAL EM HISTÓRIA

Introdução
Compreenderas contribuições de participar de um projeto de iniciação à docência para a formação dos alunos de cursos de graduação é de importância fundamental nas discussões de formação inicial e repercute mesmo nas questões relacionadas à formação continuada. Dentre os diversos subprojetos que formam o PIBID-Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência, merece especial atenção o subprojeto Interdisciplinar-Educação do Campo, por seu caráter interdisciplinar e por trabalhar com os saberes do campo.É do subprojeto da Universidade Federal de Santa Maria que partem nossas reflexões.

Para a melhor localização do leitor, iniciaremos contextualizando três campos fundamentais de discussão: O programa, a interdisciplinaridade e a Educação do Campo. Em seguida, trataremos da discussão em si, fundamentada em um questionário efetuado com 5 pibidianos, de diferentes áreas do conhecimento e experiências no PIBID. Deste questionário, serão trazidos os fragmentes pertinentes à formação do historiador, com os quais dialogaremos algumas experiências pessoais e a discussão bibliográfica relacionada.

O PIBID- Educação do Campo
“As ideias são sementes e o maior favor que se pode fazer a uma semente é enterrá-la.” (Augusto Cury)

O PIBID- Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência- é “uma iniciativa para o aperfeiçoamento e a valorização da formação de professores para a educação básica” (CAPES, 2008).O graduando que participa do PIBID é denominado pibidiano, termo constante nas discussões deste artigo.A Instituição de Ensino Superior realiza um projeto em parceria com escolas públicas de educação básica. Os projetos efetuados

“Devem promover a inserção dos estudantes no contexto das escolas públicas desde o início da sua formação acadêmica para que desenvolvam atividades didático-pedagógicas sob orientação de um docente da licenciatura e de um professor da escola” (CAPES,2008).

Em 28 de Fevereiro de 2018, o PIBID teve sua interrupção. O FORPIBID (Fórum dos Coordenadores Institucionais do PIBID) esperava a sua prorrogação até os membros do novo edital serem definidos, como aconteceu em editais anteriores. Porém, apesar dos esforços (diversos meses de mobilização marcaram esta pauta no FORPIBID), o programa não foi prorrogado. (PERES,2018). No dia 1º de Março de 2018, a CAPES efetuou o lançamento de um novo edital para o programa. Portanto, o programa deverá retornar, porém em outro formato (CAPES, 2018).

O Que é Interdisciplinaridade?
“Trabalhar em equipe não significa que todos tenham que fazer tudo mas sim ter a consciência do todo e do papel de cada um neste todo.” (Daniel Godri Junior)

Na Sociedade Contemporânea Ocidental, observa- se, atualmente, a divisão do saber em áreas de conhecimento. Cada área básica do conhecimento (Física, Matemática, História...) se diferencia das outras pela sua base teórico- metodológica, ou seja, o enfoque pelo qual aborda a realidade. Um dos principais problemas no ensino estruturado atualmente acaba sendo a falta de diálogo entre as disciplinas.

Temos, assim, a partir da década de 1960, o movimento interdisciplinar, o qual

“Aparece, inicialmente, como tentativa de elucidação e de classificação temática das propostas educacionais que começavam a aparecer na época, evidenciando-se, através do compromisso de alguns professores em certas universidades, que buscavam, a duras penas, o rompimento a uma educação por migalhas” (FAZENDA, 1994, p. 18).

Japiassu (1976) comprova a existência de diversas definições de Interdisciplinaridade, que não são consensuais. Em vista desta pluralidade, convencionaremos para este artigo como definição de interdisciplinaridade “o diálogo entre disciplinas sem que uma justaponha a outra”. Com a palavra diálogo, entendemos que a interdisciplinaridade é uma ação social e coletiva, sendo, desse modo, um diálogo entre as disciplinas, sem que uma justaponha a outra.

Como exemplo de interdisciplinaridade, podemos pensar na temática: “época de plantio”. O professor de História pode abordar temáticas ligadas ao calendário, aos costumes alimentares de diferentes povos, ou a passagem da ideia de domínio da terra para a ideia de propriedade privada; a matemática poderia calcular a quantidade média de sementes necessárias ao plantio ou o custo total da plantação; a química poderia trabalhar com diferentes minerais necessários antes do plantio (correção do solo, calagem...); a física poderia trabalhar com o nivelamento da terra; e assim, sucessivamente. Porém, caso não for possível, não é necessário abranger todas as matérias, pois qualquer esforço para dialogar disciplinas diferentes já contribui para integrar o conhecimento escolar.

A Educação Do Campo
É importante ressaltar a diferença entre a Educação do Campo e a educação no campo. “Educação no campo é uma modalidade da educação que ocorre em espaços denominados rurais” (EDUCAÇÃO, 201?). Este tipo de ensino pode partir da cultura do campo para se elaborar, bem como ensinar aos alunos do campo sobre uma cultura que é da cidade.

No artigo 28, da Lei de Diretrizes e bases, no tocante ao ensino no campo, observarmos o uso de expressões como “Adaptações” (BRASIL, 1996) e “adequação” (Idem). A utilização dessas expressões revelam que a educação atual é veementemente urbana e é esta educação que deve ser “adaptada” ao campo. Podemos pensar que o meio urbano não apresenta necessidades de “adaptação” em nenhum momento da LDB por ser no meio urbano que o ensino atual se baseia. Porém, a importância de valorizar essa cultura não deve ser subestimada. Caldart (1987), em seu livro “Sem-Terra Com Poesia: a arte de recriar a história”, mostra como a poesia e o canto são aspectos fundamentais na organização e na luta dos sem-terra, ou seja, a produção dessas simbologias “É criação viva e dinamicamente integrante das suas ações individuais e coletivas.” (CALDART, 1987, p. 141). Assim, podemos perceber como é fundamental, no ensino, a valorização da cultura do próprio meio agrícola.

Em contraposição a um ensino que parta da cidade para o campo, a Educação do Campo parte necessariamente (e este é seu diferencial) dos saberes do campo para formular o ensino, buscando não ser uma imposição da cidade para o campo, mas um esforço de diálogo que se fundamente na própria cultura do campo. Assim, entre as contribuições da educação do campo, podem ser destacadas a diminuição do êxodo rural, do desinteresse pela educação e da desvalorização do meio agrícola.

Metodologia
O PIBID- Educação do Campo traz diversas contribuições para o sistema de educação brasileiro. Estas contribuições podem ser verificadas com as professoras e os alunos das escolas abrangidas pelo projeto, mas nosso enfoque será o das contribuições para a formação do próprio graduando em História.

Em vista dessa particularidade, foi elaborado um questionário, onde cada pibidiano (a) responderia a cinco questionamentos: 1) Curso e semestre; 2) O PIBID Interdisciplinar- Educação Do Campo Contribuiu para a sua formação enquanto professor? Se sim, explique como; 3) Você levou alguma experiência vivenciada no PIBID Interdisciplinar- Educação do Campo para as discussões do seu curso e/ ou com seus colegas? De que maneira?; 4) O que você pensa que fará/fez de diferente no estágio e na atuação docente após o que vivenciou no PIBID- Educação do Campo?; 5) O PIBID Interdisciplinar- Educação do Campo trouxe alguma mudança para o seu modo de pensar e para sua vida pessoal? Se sim, quais?

Com base nesses 5 questionamentos, obtemos diversas respostas relevantes. A essas respostas, iremos acrescentar algumas ponderações pessoais, por ter participado pessoalmente deste projeto, entre o ano de 2016 e a sua interrupção em 2018. Buscaremos dialogar as respostas dos outros pibidianos e pibidianas e as vivências pessoais com a bibliografia que transpassa as questões voltadas ao Ensino de História e à Educação do Campo

Iremos nomear os(as) pibidianos(as) entrevistados(as) com as letras“A”, “B”, “C”, “D” e “E”, a fim de manter suas identidades em sigilo. Todos(as) os entrevistados(as) participaram do projeto como bolsistas.

Interdisciplinaridade: Fundamental na formação do educador!
“A interdisciplinaridade tem sido objeto de muita discussão entre professores e pesquisadores. Embora ninguém negue sua importância na constituição de um conhecimento escolar não-fragmentado que possibilite aos alunos uma compreensão do mundo em sua complexidade e com suas articulações inerentes entre a vida social e a natureza física, biológica, química, etc., o desafio é a sua concretização” (BITTENCOURT, 2004, p. 255).

Com base no que afirma a autora, percebemos a importância, na prática docente, do diálogo com a visão das outras disciplinas e suas respectivas percepções do mundo. Participando de um projeto interdisciplinar, percebemos como cada matéria pode e deve auxiliar uma à outra, para, em conjunto, formar o cidadão. A realidade na qual todas as disciplinas trabalham é a mesma, e cada uma amplia a visão do aluno e do próprio professor. Para o professor de História contribuir na formação de cidadãos, considera- se fundamental reconhecer que nossa disciplina não é a única “peça do quebra- cabeça” e compreender as outras “peças” (desenvolvimento matemático, artístico, linguístico...) que se unirão ao pensamento histórico na formação da cidadania.

Nos questionários, alguns entrevistados relataram como a “troca de experiências” (pibidiana“A”) entre os docentes em formação contribuíram para a formação enquanto professor. O pibidiano“B”, formando do curso de História, afirma: “o programa contribuiu muito, pois, ele despertou outros olhares sobre a educação e sobre o modo como lecionar”.

Conhecendo a profissão e trazendo as reflexões pedagógicas para as disciplinas do curso
Helfer (2002) afirma que muitos cursos de licenciatura de História acumulam as disciplinas científicas nos primeiros semestres e deixam para os últimos semestres as disciplinas referentes à Educação. A autora lembra, porém, que a formação de professores ocorre desde o primeiro semestre do curso. Ao não termos a preocupação inicial com ensino, recaímos em diversas problemáticas, das quais podemos destacar duas:

A Primeira problemática que apontamos tem relação com a eficiência da formação do licenciado em História. Ao ter pouco contato com as questões pedagógicas, o graduando em História não as debate durante as disciplinas científicas. Questões como “como eu ensino isso que o professor falou? Quais termos eu uso com os alunos? Quais compreensões dessa disciplina não devem faltar para meus alunos?” dificilmente surgirão nas discussões de historiografia, perdendo a maior chance de diálogo com o professor especialista. Muitas dessas questões jamais serão respondidas, e caberá ao professor “improvisar” suas respostas.

Nas entrevistas efetuadas, percebemos como os questionamentos sobre a Educação se desenvolvem conforme o andamento das atividades do curso. Essas reflexões podem se dar “trocando ideias para atividades para serem realizadas na sala de aula” (pibidiano“C”) ou em discussões de sala de aula, como mostra a pibidiana“D”:

“Os seminários em sala de aula de alguma forma abriram portas para desenvolver um diálogo aberto com os colegas sobre situações referentes a educação do campo e a situação atual que os professores vivem, além de tirar dúvidas referentes a atuação do professor do campo e do PIBID Interdisciplinar”.

O pibidiano“B” também mostra como levou as discussões do PIBID para a sala de aula:

” na minha graduação, levantei pontos importantes referente as minhas experiências no PIBID, entre eles a questão do contexto do aluno, dificuldades sociais, a representação da diversidade e respeito a todos.”

A Segunda problemática tem relação com a carreira profissional do graduando. Muitos graduandos têm pouco contato com a escola nos primeiros semestres da faculdade, e só descobrirão se gostam ou não da carreira docente após anos cursando a Licenciatura em História ou reforçar ainda mais sua convicção em relação à licenciatura em História. A participação no PIBID- Educação do Campo contribui para a compreensão do graduando sobre o trabalho docente, podendo assim evitar anos dedicados a algo que não irá gostar de praticar.

No questionário, “A” afirmou que o PIBID- Educação do Campo “possibilita que o graduando tenha certeza de que está se encaminhando para a profissão correta”. A pibidiana “D” afirma:

“O PIBID me fez amadurecer para meu futuro profissional, admirando ainda mais a profissão e me descobrindo como pessoa e profissional”.

Compreendendo o Ambiente Escolar!
O membro do PIBID- Educação Do Campo tem uma alta mobilidade no ambiente escolar e no seu entorno. O membro deste projeto tem a possibilidade de conhecer a escola (que não é apenas dentro da sala de aula!) bem como a localidade em que se encontra essa escola. A pibidiana “E” afirma:

“O PIBID contribuiu para minha formação profissional. Primeiramente por inserir- me no cotidiano escolar, possibilitando-me conhecer melhor a escola onde atuei, sua sistemática de trabalho, suas demandas e conflitos internos, além de ter-me proporcionado conviver e trocar experiências com ótimos profissionais e conhecer a história de diversos alunos, experiências estas que possibilitaram uma melhor reflexão sobre experiências e práticas pedagógicas”.

Pronto Para o Estágio!
Percebe-se, nos cursos de Licenciatura em História, que muitos alunos chegam ao estágio sem saber o que vão enfrentar. Houve concordância entre todos os entrevistados que o PIBID Interdisciplinar- Educação do Campo influenciou positivamente a prática do estágio. De acordo com a pibidiana “A”, O PIBID “facilita o estágio pois, muitas dúvidas, medos e incertezas são sanadas antes de enfrentar o estágio”. A pibidiana“D”, que ainda não participou do estágio, afirma:

“Acredito que no estágio, estarei mais preparada para atuar dentro da sala de aula junto com os alunos e professores, abrindo diálogos mais fáceis com os alunos tentando resolver problemas com mais maturidade” (pibidiana “A”)

Acreditamos que as contribuições ao estágio trarão ainda mais benefícios para a formação do licenciado, porém, não abordaremos esse questionamento, possível ponto de partida para outros trabalhos.

Conclusão
As discussões de Interdisciplinaridade e de Educação do Campo não estão encerradas. Pelo contrário, geram intensos debates nos dias atuais. A Interdisciplinaridade e a Educação do Campo não estão “completas”, mas são constantes os esforços para avançar nessas discussões. Através deste artigo, podemos perceber que o PIBID Interdisciplinar - Educação do Campo traz inúmeros benefícios à própria formação do graduando em História, dentre os quais foram destacados cinco: o exercício da Interdisciplinaridade; a compreensão do licenciando em História de sua futura profissão; o diálogo entre as discussões pedagógicas e as disciplinas específicas do curso de história; uma maior compreensão do ambiente escolar; e a preparação para o estágio. Através desse trabalho, não desmerecemos o grande impacto que o PIBID-Interdisciplinar: Educação do Campo traz para alunos, professores e outros membros das comunidades escolares abrangidas pelo projeto, mas que é uma via de mão dupla, não sendo somente a escola e seus membros que se beneficiam com o projeto, mas os próprios pibidianos e a instituição de Ensino Superior da qual fazem parte.

Referências
Rafael Fiedoruk Quinzani é discente do curso de história da UFSM. Participou do PIBID Interdisciplinar – Educação do Campo. Atualmente, participa do Grupo de Pesquisa em Ensino de História.
Orientação: Ane Carine Meurer, docente do Departamento de Fundamentos da Educação Centro de Educação da UFSM e Coordenadora do PIBID subprojeto: Interdisciplinar – Educação do Campo.

BITTENCOURT, C.M.F. Ensino de História: fundamentos e métodos. São Paulo: Cortez, 2004.

BRASIL. Lei n. 9394, de 20 de Dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9394.htm>. Acesso em: 18 fev. 2018.

CALDART, R.S. Sem-Terra com Poesia: A arte de re-criar a história. Petrópolis: Vozes, 1987.

CAPES. PIBID- Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência. Set. 2008. Disponível em:  <http://www.capes.gov.br/educacao-basica/capespibid/pibid>. Acesso em: 09 fev. 2018.

CAPES. CAPES Publica Editais do Pibid e do Novo Programa de Residência Pedagógica. 01 Mar. 2018. Disponível em: <https://www.capes.gov.br/sala-de-imprensa/noticias/8778-capes-publica-editais-do-pibid-e-do-novo-programa-de-residencia-pedagogica>. Acesso em: 03 Mar. 2018

ESCOLAS. Educação no campo e escolas em zonas rurais. 201?. Disponível em: <http://www.escolas.inf.br/artigos/educacao-no-campo-e-escolas-em-zonas-rurais/>

FAZENDA, J.C.A. Interdisciplinaridade: História, teoria e pesquisa. Campinas: Papirus, 1994.

HELFER, N.E. A prática do ensino nos cursos de formação de professores.In: PADRÓS, E.S. et al. Ensino de história: formação de professores e cotidiano escolar. Porto Alegre: EST, 2002.

JAPIASSU, H. Interdisciplinaridade e Patologia do Saber. Rio de Janeiro: Imago, 1976.

PERES, P. O PIBID não vai acabar - mas vai dar um tempo. fev. 2018. Disponível em: <https://novaescola.org.br/conteudo/10024/o-pibid-nao-vai-acabar-mas-vai-dar-um-tempo>. Acesso em: 15 fev. 2018.

SCHMIDT, M.A. O desafio de ensinar História quando a História foi extinta nas escolas. dez. 2014. Disponível em: <http://www.gazetadopovo.com.br/vida-e-cidadania/o-desafio-de-ensinar-historia-quando-a-historia-foi-extinta-nas-escolas-ehc3qh8l0viwed9l42wawrz9q>. Acesso em: 15 fev. 2018.

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